Os bastidores da maior prisão em massa da história brasileira

09 setembro 2025

 


Em outubro de 1968, cerca de 800 jovens vindos de todo o Brasil se reuniram clandestinamente em um sítio em Ibiúna, interior de São Paulo, para realizar o 30º Congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE). A intenção era discutir o futuro do país, estratégias de resistência à ditadura em voga e a renovação de lideranças do movimento estudantil.

O que nasceu como um novo fôlego da luta democrática transformou-se, porém, em um dos episódios mais marcantes da história brasileira recente: após cercar o local, a polícia promoveu a maior prisão em massa já registrada no país, levando centenas de estudantes para o Presídio Tiradentes.

É esse incidente que o jornalista, escritor e biógrafo Jason Tércio reconstrói com riqueza de detalhes em Sitiados – A saga do Congresso de Ibiúna em 1968, lançado pela Matrix Editora. Com narrativa que mistura jornalismo investigativo, crônica histórica e suspense, o autor mergulha nos bastidores da preparação clandestina do congresso.

Ele detalha o uso de senhas e contrassenhas elaboradas, os deslocamentos em segredo, o improviso da logística em meio a riscos permanentes de delação, a vigilância policial com uso de agentes infiltrados e até os conflitos internos entre correntes da esquerda universitária, que disputavam espaço e a direção da UNE. 

A obra contextualiza os leitores sobre a tensão crescente daquele ano decisivo, marcado pelo enterro de Edson Luís, assassinado pelos militares, pela Passeata dos Cem Mil, pela franca brutalização do regime e pelo ambiente internacional de rebeliões juvenis, de Paris ao Vietnã.

Tércio mostra como, mesmo diante da repressão, os estudantes acreditavam que era possível mobilizar a sociedade em favor da democracia, enquanto o governo militar avançava com leis arbitrárias, espionagem e violência institucionalizada. 

Com base em documentos do antigo DOPS, depoimentos de participantes, panfletos mimeografados, fotografias e registros de época, o livro reconstrói em detalhes a invasão do sítio em Ibiúna, o terror da operação policial e a prisão em massa, além da vida precária e a resistência dentro do Presídio Tiradentes.

A reunião em Ibiúna, mesmo com a derrota imediata, repercute até hoje. Muitos dos estudantes envolvidos, como José Dirceu, Vladimir Palmeira e Luís Travassos, ocupariam papéis centrais na política e na cultura nacional nas décadas seguintes. 

Mais do que resgatar um episódio quase apagado da história oficial, Sitiados mostra como a experiência de Ibiúna abriu caminho para novas formas de enfrentamento à ditadura e marcou uma geração que se descobria protagonista de seu tempo. O livro, que dialoga com dilemas atuais, como autoritarismo e repressão, coloca em destaque a força das mobilizações populares.


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